10 de out. de 2009

drogas, modos de usar - ou a peneira, o sol, o deputado e o jornalista reaça

que sol, hein deputado?
vai uma peneirinha aí?

Não sei como foi com vocês, mas lá em casa se falava abertamente sobre o consumo de uma droga muito usada na própria casa em reuniões com os amigos dos meus pais, em quase todas as casas ao redor da nossa, nos lugares que visitávamos nos finais de semana, no playground do prédio onde a gente morou ... Era muito comum ver alguém bebendo cerveja, vinho, uísque ou cachaça. Geralmente acompanhado de uns pedaços de fruta, amendoins ou alguma fritura gostosa pra cacete. Que a gente não podia comer, porque era coisa de adulto e era só esperar que “daqui a pouco já ia sair o almoço”.

Não era segredo pra ninguém, na manhã de sábado, do feriado ou nos aniversários a galera bebia - e muito - reunida por um violão, um jogo ou uma churrasqueira e costumava ficar mais engraçada, mais sincera, falar mais palavrão ou chegar a cair e arrumar confusão se continuasse bebendo depois do fim da festa.

“Cada um tem seu limite, só você vai saber o seu. Aprenda a respeitá-lo”. Caralho, como eu ouvi isso da minha mãe... toda vez que a ressaca infernal do dia seguinte me lembrava que o conselho tinha sido completamente ignorado durante a noite de bebedeira. E pra mim sempre foi muito fácil conseguir essa droga – e passar dos limites usando-a - antes que eu tivesse a idade certa para comprar, ou em garrafas pequenas para beber em locais proibidos e, até bem pouco tempo atrás, em postos de gasolina, onde se entra e sai dirigindo um carro! Era muito comum driblar uma lei qualquer em função de conseguir álcool para consumo.

Pelo que me lembro, as informações para minimizar os efeitos da droga que reúne e enlouquece o país sempre puderam ser encontradas em conversas, livros, revistas...

“Não misture bebidas”, “beba alguma água entre uma dose e outra”, “passe a chave do carro para alguém que bebeu menos”, "não se bebe de estômago vazio", “não se fecha negócio em mesa de bar”, “porre não se comenta”... Sem contar a parte “engraçada” do hábito de ficar louco depois de tomar umas e outras: “não existe mulher feia, você é que bebeu pouco”, “cerveja: desde 1880 ajudando gente tímida a trepar”, “depois de beber, você consegue fazer um quatro, um oito... e um doze?”

No meio de muito reducionismo e anedotário era só ter algum bom senso e perceber que as boas dicas estavam realmente ali. Colocar em prática era só questão de amadurecimento e bom senso.

Pois bem, fui crescendo e a ficha finalmente foi caindo... Aprendi que no Brasil - depois de grande - você pode se reunir com os amigos para conversar, paquerar, contar piadas e se drogar. Na calçada de casa, no boteco na esquina do trabalho, durante o almoço de uma sexta de pouco movimento, numa manhã de folga... todo mundo pode lhe ver consumindo droga. No meio da cantada, para estabelecer um laço de amizade, saber mais sobre os bastidores do trabalho é permitido oferecer droga e deixar alguém relaxado ao ponto de fazer ali um grande amigo ou começar um romance.

Hábito largamente aceito, mas que nem por isso deve ser confundido com inofensivo: ingerir bebida alcoólica É fazer uso de droga. Saber como não acabar se fudendo pelo abuso dessa substância é dever de pais, professores e responsáveis por menores de idade. Ignorar o assunto é abandonar pessoas em formação à própria sorte, é desumano e é um descaso filho da puta.

Essa é uma das causas que move os grupos que organizam as marchas da maconha no Brasil. É preciso identificar as substâncias utilizadas por um povo em determinada época e ajudar - todos que quiserem – a reduzir os danos de consumo do que estiver sendo usado.

Setores conservadores (e desinformados) da sociedade, representados por gente do nível dos Deputados Federais Laerte Bessa e ACM Neto, o “blogueiro da Veja” Reinaldo Azevedo ou o “repórter de crime” Jorge Antonio Barros parecem pensar o contrário. Além de não concordarem com o livre trânsito de informações e dicas de redução de danos, eles ainda consideram impensável, perigoso e/ou imoral o debate público sobre drogas na sociedade brasileira. Nunca os vi se pronunciando sobre o consumo de álcool, mas quando o assunto é consumo de maconha esse é o tom usado.

Nos textos e discursos desses caras, tudo vira chacota ou ameaça à ordem vigente: “um ministro de estado não pode se envolver com palhaçadas como a marcha da maconha”, “descriminalizar a maconha é perigoso”, “maconha é comprovadamente porta de entrada para o crack”

Será que eles acreditam que amigos, parentes, fornecedores, sócios e colegas deles não estão entre o público consumidor de maconha no Brasil?
Ou que esses consumidores não merecem informação e atenção especializada? Só uns cascudos?
Que manter essa posição dura contra quem quer o debate sobre a guerra - que mata, aleija e destrói milhares de brasileiros - os faz melhores que os outros?
Que a melhor saída é ignorar os fatos e manter a milionária guerra para erradicar (?!?!?!) as drogas do mundo?

Ou como disse recentemente (sobre outro assunto) o Arnaldo Branco: essas pessoas não promovem uma visão distorcida da realidade porque não têm noção nenhuma da realidade.

Esse texto é dedicado a Átila, um amigo que morreu sexta-feira. Vítima de uma bala de revólver e não da substância que consumia.

2 comentários:

Anônimo disse...

Sinto muito pelo falecimento do seu amigo!
Nao entendo como alguem nao ve que a repressao e pior do que a propria "droga".

neco tabosa disse...

valeu, fera!

eu tb não entendo...